AS PEDRAS QUE ENCANTAM O MUNDO
O que têm em comum os calçadões de Copacabana e Ipanema, a Praça dos Três Poderes em Brasília e a Lagoa Paulino? Não precisa ir muito longe. Basta olhar para o chão. Todos esses lugares, cada um com suas formas, têm em comum os desenhos artesanais das pedras portuguesas. E as semelhanças não param por aí. Poucos sabem, mas aquelas pedras, que juntas formam desenhos que encantam turistas de todo o mundo, saíram diretamente de Sete Lagoas.
Isso porque a cidade é uma das principais fornecedoras das tradicionais pedras portuguesas no Brasil. Da descoberta até hoje, são mais de 70 anos ornamentando as mais belas calçadas do país. Lugares tão distantes como o Calçadão de Ponta Negra em Manaus, a Passarela do Álcool em Porto Seguro (BA) ou mesmo a calçada do Conjunto Arquitetônico da Pampulha, um projeto de Oscar Niemeyer e hoje considerado Patrimônio Mundial da UNESCO, utilizaram as pedras da região de Sete Lagoas.
A cidade começou a vender as pedras portuguesas ainda no período da II Guerra Mundial. “Um comerciante de cristais viu que as pedras de Sete Lagoas estavam sendo utilizadas na construção de calçadas no Rio de Janeiro. Foi assim que ele e meu avô, Amaltino França Diniz, começaram a comercializar as pedras, para as praças do Rio”, revela o proprietário da Pavi Sete, Eduardo Diniz Salles, que administra o negócio que está na família há três gerações. Segundo Eduardo, no início os dois comerciantes precisavam afirmar que as pedras vinham de navio de Portugal. “Para ganhar o mercado, eles não podiam falar que era de Sete Lagoas”, conta Eduardo.
Aos poucos as pedras extraídas da cidade ganharam o mercado e todo o Brasil. Há mais de 50 anos, Osmar Antônio Nascimento é um dos principais fornecedores das pedras de Sete Lagoas. Ele recorda do primeiro trabalho realizado, no município de Piraí, no interior do Rio de Janeiro. “Era uma praça grande, próxima à Estação Ferroviária”, recorda o sócio da Pedras Sete, junto com a esposa Luíza Helena Masula Dornas Nascimento. Ele também foi responsável pela instalação das pedras de outro cartão postal do Rio de Janeiro, o Morro da Urca. “Eu olho esses calçamentos e me sinto orgulhoso de fazer parte dessa história do país”, afirma Osmar.
Mas para quem olha aquelas verdadeiras tatuagens urbanas nas ruas das cidades, não imagina o extenso processo, desde a extração até a instalação. Tudo é feito praticamente de forma artesanal. Após serem retirados os blocos das jazidas, cada pedra é esculpida à mão. “Cada pessoa consegue, em média, fazer três toneladas de pedras no corte à mão”, calcula Osmar.
Para instalar as pedras entram em cena os calceteiros. “Eles são verdadeiros artistas. É preciso, além de muito conhecimento e técnica, ter criatividade para fazer as calçadas”, garante Eduardo Salles. As pedras são colocadas uma a uma e depois compactadas, muitas vezes com um compactador de madeira. “Todos os calceteiros que conheço gostam do que fazem. E se esforçam para fazer cada vez melhor”, observa.
Não há uma escola para se tornar calceteiro profissional. O aprendizado é na prática e a especialização vem com o tempo. “Um pedreiro, por mais caprichoso que seja, não tem o carinho e cuidado de um calceteiro”, afirma Osmar. Para qualificar ainda mais a mão de obra, em 2015, o governo do Rio de Janeiro montou turmas de profissionais para o aperfeiçoamento. Para ensinar, trouxeram mestres calceteiros vindos de Portugal.
Das calçadas, as pedras portuguesas começam agora a ganhar também as paredes. Alguns arquitetos já utilizam as pedras para fazerem revestimentos nas obras, com diversas texturas e formatos. “Isso começou a ganhar mercado há uns cinco anos, graças às argamassas, que possibilitaram levarmos as pedras para as paredes”, revela Eduardo.
Quando se trata de pedras portuguesas, os números são sempre grandiosos. Para cada 1000 metros quadrados de calçada, se gasta em média 100 toneladas de pedras. Hoje, a Pavi Sete produz em média 700 toneladas de pedras por mês, o que representa cerca de 9000 metros quadrados. O Rio de Janeiro, a cidade com a maior extensão de calçadas portuguesas do mundo, com mais de 1,2 milhões de metros quadrados, já foi o principal consumidor das pedras de Sete Lagoas. Mas isso mudou. “Hoje, nossos principais clientes estão no Centro-Oeste. São cidades do Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Brasília, Tocantins e ainda o interior de Minas Gerais”, revela Eduardo.
No Brasil, a primeira calçada portuguesa data de 1905 e fica em frente ao Teatro Amazonas, em Manaus, com um trabalho em ondas simbolizando o encontro das águas do Rio Negro e Solimões. Dali, as calçadas se espalharam pelo Rio de Janeiro. A primeira foi a calçada da Avenida Atlântica, já com um desenho de ondas, depois vieram a Cinelândia e boa parte do centro do Rio, Copacabana e Vila Isabel. Mas foi no final da década de 1960 que o paisagista Burle Marx modificou o traço e criou o famoso desenho que hoje é conhecido em todo mundo. E foi justamente nessa reforma, na década de 1970, que as pedras de Sete Lagoas pintaram o chão de Copacabana com as famosas ondas.
Fonte: acisetelagoas